O Dia Internacional da Mulher
foi ofuscado pelas folias do Carnaval, mas ainda - e quiçá fossem todos os dias
– estamos falando do papel da mulher na sociedade.
Foi assim que dia 14 último, em
comemoração ao Dia D´Ela, assisti - durante
o expediente de trabalho - uma séria e
importante palestra sobre o tema tráfico de pessoas, proferida pela socióloga Márcia Maria Oliveira, doutoranda do Programa de
Pós-Graduação Sociedade e Cultura na Amazônia da Universidade Federal do
Amazonas - UFAM. Pesquisadora do tema tráfico de mulheres na Amazônia é autora, em
parceria com Iraildes Caldas Torres, do Livro “Tráfico de Mulheres na
Amazônia, publicado em 2012.
O Brasil é um país que tem um
cabedal de leis, e até podemos classificá-las
de “quase perfeitas”. Exemplo disso é o
Decreto Nº 5.948, de 26/10/2006, que instituiu a Política Nacional de
Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. Estabelece, dentre outras, as
bases do Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas – PNETP, uma
legislação bastante avançada. No entanto, segundo a pesquisadora, a operacionalização
do PNETP, através dos núcleos espalhados nas regiões mais críticas
e vulneráveis, não consegue concretizar a legislação. Esse é o (grande) problema do Brasil: tem as melhores leis, mas o problema é aplicá-las.
Durante a palestra, foi lido um dos depoimentos
publicados no Livro, de uma mulher, com 8 anos de idade à época em que foi
levada de sua família, com a promessa de que seria “filha de criação” de um casal, com direito a estudos,
inclusive. No interior, é costume pessoas estranhas à família tornarem-se “padrinhos”,
uma espécie de ritual praticado nas
festas juninas. Mas fica valendo como se fossem
mesmo padrinhos, como no batismo
da criança, uma prática da Religião Católica.
Os pais da então menina, certamente carentes e ignorantes,
confiaram naquela promessa e permitiram que a filha fosse embora, mesmo sem
querer sair de perto de seus pais. Mas era apenas uma menina com 8 anos de
idade.
Ao chegarem ao destino (Rio de Janeiro), a menina
não teve o que foi prometido a ela e aos seus pais, pelos padrinhos. Muito pelo
contrário. Apanhava quase que diariamente, até aprender a fazer todo o serviço
da casa (limpar, lavar, passar a ferro as roupas etc). Foi colocada em um
quarto, nos fundos da casa, tendo tratamento diferenciado dos demais da
família. Segundo o seu relato no livro,
o homem (padrinho), noites
seguidas, levava o filho de 15 anos até
seu quarto, e lá a usava sexualmente,
mostrando ao filho como deveria fazer o
mesmo, com ela. Relata que gritava muito
e tinha certeza que a “madrinha” a escutava e sabia o que se passava no seu
quarto, mas nunca tomou nenhuma atitude.
Engravidou 5 vezes, e em todas a “madrinha” dava-lhe remédio para abortar. Depois de
quase 10 (dez) anos assim, um dia conseguiu fugir.
O estudo da socióloga é resultado de intensa
pesquisa e entrevista com meninas/mulheres que vivem na prostituição, geralmente
em países da Europa, como Espanha, Itália
e Portugal. Segundo ela, essas mulheres foram traficadas, com a promessa de
empregos. Algumas, até menores de idade, com documentos falsos, saem com visto
de turista e, após esse período, somem literalmente do mapa. Ficam nesses países
de forma irregular, e o aliciador se aproveita da situação para escravizá-las
de todas as formas.
Infelizmente, a Região Amazônica é uma das rotas
preferidas pelos aliciadores. Márcia comentou que ao fazer a pesquisa soube que
um estrangeiro, se dizendo pesquisador de uma instituição científica da nossa cidade,
levou com ele uma garota, até hoje sem a Polícia e a família saberem o
paradeiro.
As reservas indígenas da Amazônia, segundo a
socióloga, nem são tão “reservadas” como
se pensa. O trânsito é livre por lá e “o
direito de ir e vir está garantido ... (...) ... o fato de estar numa
reserva indígena não constitui uma garantia de imunidade ao tráfico ...(...)...
o tráfico de meninas e mulheres indígenas é muito antigo na região,
especialmente nas áreas de fronteira onde há forte presença do Exército que
representa a presença do Estado, e nem por isso consegue coibir o tráfico, pelo contrário”, afirmou.
Não é segredo que os antecedentes históricos do tráfico de pessoas na região vêm desde o processo de colonização da Amazônia. Por terem suas aldeias geralmente às margens dos rios amazônicos, os índios foram - e continuam sendo - alvo de toda forma de exploração, inclusive sexual, tornando mulheres e crianças vulneráveis, continuamente.
Em outro momento áureo (?) da nossa história - o Ciclo da Borracha, de 1879 a 1945 -, foram registrados raptos e a comercialização de crianças e adolescentes do sexo feminino, para o trabalho escravo e a exploração sexual.
Portanto, por ser um tema de suma importância, vale a pena registrar parte de uma entrevista da socióloga ao portal Amazônia Real , da qual extraio o texto abaixo, para jamais esquecermos de discutir esse tema, em qualquer espaço, em qualquer data, porque, embora não tenhamos próximos a nós algum caso de pessoa traficada, isso não é motivo para nos mantermos alheios ao mais ignóbil e mais rentável crime de todos os tempos, perdendo somente para o tráfico de drogas e de armas: o tráfico de pessoas.
Não é segredo que os antecedentes históricos do tráfico de pessoas na região vêm desde o processo de colonização da Amazônia. Por terem suas aldeias geralmente às margens dos rios amazônicos, os índios foram - e continuam sendo - alvo de toda forma de exploração, inclusive sexual, tornando mulheres e crianças vulneráveis, continuamente.
Em outro momento áureo (?) da nossa história - o Ciclo da Borracha, de 1879 a 1945 -, foram registrados raptos e a comercialização de crianças e adolescentes do sexo feminino, para o trabalho escravo e a exploração sexual.
Portanto, por ser um tema de suma importância, vale a pena registrar parte de uma entrevista da socióloga ao portal Amazônia Real , da qual extraio o texto abaixo, para jamais esquecermos de discutir esse tema, em qualquer espaço, em qualquer data, porque, embora não tenhamos próximos a nós algum caso de pessoa traficada, isso não é motivo para nos mantermos alheios ao mais ignóbil e mais rentável crime de todos os tempos, perdendo somente para o tráfico de drogas e de armas: o tráfico de pessoas.
“Todos esses elementos nos permitem compreender uma
das dimensões da condição da mulher na Amazônia e a necessidade de
desnaturalizar as relações de poder e dominação a que fomos e continuamos sendo
submetidas. Tais condições de dominação deixam caminhos abertos para a atuação
das redes de tráfico em toda a região onde crimes como a pedofilia, o estupro e
a escravidão não são denunciados e favorecem a atuação dos aliciadores que
recrutam mulheres e meninas para a prostituição nos grandes centros, nos
garimpos clandestinos no interior da Amazônia, nas frentes de trabalho dos
grandes projetos como a construção do gasoduto de Coari, das hidroelétricas e
mineradoras. Além disso, muitas são levadas para outros países com a mesma
finalidade.
Como mudar esse quadro na
Amazônia?
De acordo com as análises antropológicas e
sociológicas, a única forma de romper com esse ciclo vicioso é investir mais na
valorização da dignidade humana na região, promovendo maior acesso à educação,
saúde e trabalho. Outra questão importante é investir nos mecanismos de
enfrentamentos ao tráfico de pessoas, suas diferentes dimensões, causas e
consequências, bem como difundir informações sobre o que pode ser feito para
fortalecer os mecanismos de prevenção e atendimento às vítimas. Isso pode
trazer uma contribuição importante ao enfrentamento desta grave violação dos
direitos humanos na Amazônia.”
Se você sabe de algum caso de tráfico de pessoas, denuncie. Faça a sua parte.
Mamãe Coruja
É... o sexo também pode ser pornográfico...
ResponderExcluirDesse jeito...pode,sim.
ExcluirAgradeço a honra de "ilustre" visitante.
Ilustre, o Paulo Moura? ihihihih... digo, rsrsrsrs
Excluirrsss...ora...pra mim,sim.
ResponderExcluirAliás...todos!
ResponderExcluirObs: como posso comprar o DicioOrdinário IlusTarado? com dedicatória personalizada, claro.
Pago em euros, em dólar, em real?
Um amigo meu, de S. Paulo, ofereceu-me um livro de poesia dele em troca do DiciOrdinário. Quando vimos o custo dos portes, até nos benzemos. A solução foi um familiar dele, numa visita a Portugal, trazer o livro de poesia dele e levar o DiciOrdinário com ele. Tens alguém cá em Portugal ou que venha cá?
ResponderExcluirTer, tenho. Mas, tal como vocês, ainda não vieram aqui. A única alternativa é buscar aí...rsss
ResponderExcluirIsso! Como se diz na minha terra, "nem és homem nem és nada!" :O)
ExcluirEita...!
ResponderExcluir:O)
ExcluirComo comentei no blog da Tuna Meliches, um colega meu vai passar uma semana a Belém do Pará (que já vi que é a 3.000 Km - só!!!! - de Manaus). Se quiseres que ele leve o livro e ponha no correio lá, para ti, só tens que me enviar o teu nome e morada completa para afundasao@gmail.com (sim, a São Rosas é uma personagem criada por mim)
ResponderExcluirEle vai é já neste sábado e só lhe posso dar o livro e a indicação de morada até 6ª feira...
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